quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

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Ele era publicitário, limpo, engravatado, saudável.
Deglutia maçãs com gula de chocolate.

Organizado, era um saquinho

zip-lock

tornado
homem.

Seus olhos delineavam o mundo traçado de linhas pretas e precisas.

*

Ela não podia ser mais diferente. Se fosse homem, teria barba grande e desgrenhada.
Jeans, tênis, e garrafas de cerveja nas duas mãos - e uma equilibrada no nariz.

Seus olhos verdes turvavam um mundo de linhas que vão e vem fazendo curvas.

*

tiveram duas crianças:
Maria Flor, que ela achou bonito
e Áldamo, que era o nome do avô dele.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

(observação: agora qualquer um pode comentar aqui, mesmo sem contas no google, ou no blogger ou etc.)

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Portas da Felicidade


Estamos num programa de auditório e um sujeito com cara de bobo está parado em frente a três portas.

A platéia berra, agoniada: uummdoiiiisummmtreeeessdoisssummm.

O sujeito com cara de bobo se encaminha timidamente a porta do meio. Abre, com medo, e eis que surge um outro sujeito, fantasiado de macaco, GRITANDO MUITO ALTO E PULANDO E RUGINDO.

Nosso herói se assusta e caí no chão.

A produção pega o orangotango pelos braços, mete ele de volta na porta do meio e a fecha.

O sujeito com cara de bobo se levanta e, dessa vez, anda com passos firmes até a porta da direita.

Abre.

Entra

e

fecha a porta atrás de si.

(silêncio absoluto)



Em seguida:

O apresentador do programa de auditório dá a deixa.

Uma moça com roupas justas começa a fazer propaganda de cosméticos.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008


Yesterday Upon the Stair

I met a man who wasn't there

He wasn't there again today

Oh how I wish he'd go away

(William Hughes Mearns)

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Assim Foi

Já fui um Ser Encantado, já fui Hobbit, às vezes fui filho, já fui pai, frequentemente sou irmão mais velho ou mais novo.

As coisas me moldam com facilidade variável, mas nunca deixo, e penso que nunca deixarei, de ser moldável e essencialmente mutável.

Uma das minhas formas recorrentes é a do autômato que lê livros. É tambem um andróide que carrega um mistério calado consigo, mas que traz, talvez paradoxalmente, a história de sua vida na ponta da língua.

O autômato surge de modo reverso ao da borboleta. Gradualmente, me transformo, de coisa viva e móvel em casulo metálico, que ecoa com meus passos pesados.

Acho que já entenderam que não tenho forma definitiva. Nem autômato nem borboleta, sou coisas diferentes em tempos diferentes, mas as transformações precisam ser motivadas por algo.

...

Sabem como deixei de ser autômato da última vez?

Foi obra de uma menina. Ela se aproximou de mim, um dia, e passou a mão suavemente sobre meu braço. Assim, deixei cair todo o pó metálico que me cobria o corpo e que tolhia meus movimentos de ser fugidio.

Assim foi.



(nota: este texto foi para os dois blogs, porque achei que assim cabia)

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Frente a frente –

Extendem os braços, rápidos

(angústia mortal) – AGORA! AGORA!

Se aproximam, os peitos se tocam aveludados, os braços se entrelaçam rijos nas costas deles

Ele baixa um dos braços à altura da cintura dela, o outro se enrosca no pescoço

Ela faz o mesmo

Eles se apertam

Se apertam

E - -

Se apertam

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Três Pedaços Infinitos Não Necessariamente em Ordem

Subiram as escadas do metrô. Subiram juntos e pausadamente, cansados, as escadas do metrô. Subiram apaixonadamente, juntos para sempre as escadas do metrô. Mãos dadas.

A avenida Paulista, à hora do último metrô da noite já estava meio deserta, fria. Ele queria olhar as horas no celular, mas o havia desligado para fugir do controle materno, e ela idem. Foram andando até o vão do Masp. Lá olharam pro céu muito pouco estrelado e se abraçaram.

Infinito.

*

O sinal do intervalo tocou, e saíram de suas respectivas salas, pares de olhos se procurando. Química orgânica, seus empregos, os pais, o trânsito pra voltar pra casa, a menstruação atrasada um mês e meio, o vestibular, intervalo.

Foram juntos pruma área cheia de árvores, longe dos olhares instituídos. Ele acendeu um cigarro, e ela se sentou junto à parede e ficou falando.

Ele deu um trago, e começou com aquilo – dava uma passada larga, depois tentava medir uma passada de metade do tamanho da primeira, depois metade dessa, e assim por diante, até que seus pés já não conseguiam acompanhar sua brincadeira, que pela tradição ia de encontro ao sem-fim.Tudo terminava num ridículo símile de balé.

O cigarro pendia de sua mão, e ele escutava com seu ouvido quotidiano o que ela tinha a dizer com sua boca quotidiana.

*

Ela saiu do banheiro. Disse que não era nada, e felizes se beijaram. Felizes foram pra cama dizendo euteamos entre suspiros e gemidos. Morreram juntos, em uníssono. Morreram até o sol nascer de novo. Fizeram tudo de novo.